Roberto Furquim Marinho tem nome de advogado. Mas advogado é o pai dele: o escritor João Carlos Marinho.
Assim como o pai, Beto Furquim tem uma identidade de artista. E uma profissão que garante o seu fazer artístico: jornalista e editor de livros. A arte de Beto é a música.
Em 2009, estive com o pai de Beto num evento comemorativo dos quarenta anos do livro infantojuvenil "O Gênio do Crime". E lá estava o filho de João Carlos no evento. Voz suave, fala calma, atuou como mediador informal do debate com as crianças.
Nessa ocasião, sabia que o filho do escritor tinha uma obra musical, mas não conhecia o CD "Muito prazer". E ignorava que o disco tinha sido gravado aos poucos, bem ao ritmo do tempo e dos recursos do músico e compositor. A conclusão das gravações veio com o Prêmio Estímulo de Música da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, concedido a Furquim em 2007.
Ano passado, comprei o CD "Muito prazer" numa loja virtual. Atraído pela capa em tons azuis e verdes, folheei o livro em formato de compact disc - com o compact disc dentro, é claro.
Os desenhos de Alex Cerveny, impressos sobre as páginas em cores chapadas, me remeteram às vinhetas que o desenhista publicava na coluna de Joyce Pascovitch na Folha de S. Paulo.
A segunda coisa que busco ao folhear um encarte de CD são as dedicatórias. A quilometragem de nomes, que por vezes ocupam uma página do encarte em letrinhas de bula de remédio, diz muito dos afetos acumulados na trajetória do cancionista. No caso de Beto, eles são muitos, e ainda bem.
Sabedor da participação de Beto Furquim como compositor de Estrela da manhã no festival temporão da TV Globo em pleno ano 2000, fui procurar a canção no disco. E achei. Melhor ainda: a Estrela de "Muito prazer" trazia Monica Salmaso, intérprete original da música no festival. Só ela e o piano de Benjamin Taubkin. Um bálsamo para os ouvidos.
Outro participante do disco familiar aos meus ouvidos é Mauricio Pereira, fundador com André Abujamra da "terceira menor big-band do mundo", Os Mulheres Negras. Pereira também tem um trabalho-solo de discos ora autorais, ora divididos com uma banda de breguices pop e marchinhas de Carnaval. Saxofonista dos bons, jornalista atuante, atual locutor preferido dos comerciais descolados de televisão, Mauricio participa de Longe do Planeta, faixa composta por Beto para "Muito prazer".
A essa altura do encarte, os olhos tinham percorrido todo o território visual do encarte, em doses alternadas de atenção. Era hora de percorrer os espaços sonoros da obra.
Os músicos reunidos por Furquim são velhos conhecidos dos que acompanham a música feita em São Paulo: Swami Junior, Rogério Rochlitz, Mário Manga (ex-Premê e um dos produtores do disco).
A voz plácida de Beto Furquim permanece plácida em todas as faixas, mesmo que os ritmos e sons variem na intensidade e nos andamentos. Que que tu tanto quer? soa brincalhona em seu jogo de palavras, a começar pelo título. Traz aquele à-vontade dos cancionistas que sabem encaixar palavras e sons no suingue. O arranjo de metais de Manga e Duca França torna a canção ainda mais deliciosa.
À Beira-mar é um samba-crônica tão simpático, tão cativante, que tira pra dançar até os incapazes de um movimento gingado, como este que vos digita. Tudo bem, pode-se sacudir o esqueleto do jeito que dá. Talvez seja esse o desejo de Beto: provocar o sacolejo e o bater de palmas do ouvinte. Ao som dos passos de Aninha e Alaor, o casal unido pela música em Salvador.
Paz e rima e Quero você assim, duas canções igualmente suingantes, seguem a linha das cantadas delicadamente alto-astral que atravessam o disco todo. Resposta e Olhos de morcego tem voz-e-violão que lembram os melhores momentos de Gilberto Gil. Margem faz par com Jing Ye Si em clima zen-budista. "Muito prazer" tem fim com Sinuosa e Logo você, pérolas dignas da melhor tradição pop mundial, mesmo que cantadas em português.
O cantor e compositor com nome de advogado cumpre à risca o título de seu primeiro trabalho-solo. O prazer é nosso, Beto! E vê se volta logo, que música feito a sua nunca é demais.
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