Domingão, e eu sentado na Rua do Porto, em Piracicaba, fazendo caricaturas de quem passasse por mim.
Um dos que passaram por mim quis ficar.
Foi só dar atenção às palavras do passante, influenciadas por algumas latinhas de cerveja, que o tal sentou praça perto de mim.
Após uma saraivada de elogios superlativos ao desenhistas em geral, o senhor encervejado resolveu proclamar as qualidades dos canhotos. Ele havia percebido que eu rabiscava com a mão esquerda.
O sinhôzinho era canhoto como eu, mas não desenhista. E fez o favor de estragar meia dúzia de papéis do desenhista aqui, garatujando um fusca com cara de monstro do lago Ness.
Cabia a mim concordar com o meu interlocutor ou jogá-lo no rio Piracicaba, cuja margem estava próxima de mim.
Enquanto o senhor expunha a frustração em não ter sido ungido pelo dom do desenho, meu rosto esboçava uma expressão contrariada. Canhoto costuma ser do contra mesmo.
Aliás, quando eu disse pela primeira vez em casa que era canhoto, minha falecida avó persignou-se e proclamou que canhoto era sinônimo de coisa-ruim.
Ser canhoto era ser diferente, uma aparente vantagem. Aparente.
Abrir latas, por exemplo, não era uma situação agradável no meu cotidiano. Não podia abrir uma sem que minha querida mãe não soltasse um berro, aquele berro ardido de mãe zelosa, e me dissesse "para abrir a lata direito". Direito é que eu não era! Ia mais pelo esquerdo mesmo.
Voltei à terra e ao discurso do velhinho. Cá com meus botões, pensei em como seria bom que o tempo passasse depressa e levasse aquele senhor. Acabada a catilinária, por absoluta ausência de outros assuntos, ele pediu desculpas por me alugar e azulou dali.
Minutos depois da fuga tropeçante do meu inesperado interlocutor, consumei uma saída pela esquerda.
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