30 de jan. de 2012

Não é todo dia que aparece uma cantora assim

Até outro dia mesmo, a oferta de cantoras ao respeitável público se dava via rádio. O ouvinte, devidamente seduzido, dirigia-se à loja de discos mais próxima, para comprar o hit impresso nos sulcos do vinil.

Outras canções, além do hit radiofônico, completavam o vinil. A cantora viajava Brasil afora, divulgando o disco ao vivo em shows. Fechada a turnê, pensava-se no disco seguinte.

Só que o tempo passou. Hoje, há as cantoras das multidões, feito Ivete Sangalo. Mas existem as cantoras da hora, como Paula Fernandes, de vida incerta na próxima hora. As intérpretes cumprem, com ligeiras diferenças de época e mídias, o roteiro descrito no primeiro parágrafo.

E as cantoras nascidas na internet? Que não vivem de música, mas para a música? Elas abrem espaços no peito, na raça, no coração. Inclusive Danny Reis.

Ao contrário das divas à la Marisa Monte, o perfil das cantoras-internet feito Danny é acessível aos seres humanos "normais", como este normal que vos digita. Tão normal, que a conheci numa lista de discussão de música na internet, a M-Música. Lista que marcou as vidas de quem participou dela. E tão marcante, que gerou parcerias entre os membros do espaço virtual, para além das trocas de e-mails e idéias. Danny Reis fez seu primeiro CD apenas com canções feitas por membros da lista.

O CD Todo Dia, nesta época de MP3 invasores de I-Pods indefesos, é uma festa para os olhos, antes de chegar aos ouvidos. A embalagem não é um estojo de plástico, um CD tradicional. O formato é o de revista de bolso, em papel cuchê e arte preto-branco-amarela. Abre-se a revista, e o CD está protegido por um envelope amarelo.

Um poster gigante, devidamente dobrado pra caber na embalagem, traz as letras das canções, os créditos dos compositores, as fotos da gravação em estúdio. Tudo perfeitamente legível, em dimensões decentes. Os olhos dos apreciadores da música brasileira agradecem.

Olhos satisfeitos, passemos aos ouvidos. O CD traz uma multidão a serviço da beleza. A voz de Danny Reis é a placidez em forma de canção. Os parceiros de poesia (Zé Edu Camargo, Gulvandro Filho, Etel Frota, Cacala Carvalho, Alexandre Lemos. Léo Nogueira, Tony Pelosi) misturam-se aos senhores das melodias (Sonekka, Felipe Radicetti, Adriana Barreiros, Iso Fischer, Guilherme Rondon). Zé Rodrix (autor de "Casa no Campo" com Tavito e integrante do trio Sá, Rodrix e Guarabyra) também aparece na ficha técnica como parceiro de Zé Edu Camargo em "660 Huntington Blues".

O que soa ainda mais agradável no disco de Danny Reis e a ausência de megalomania autoral que acomete tantas novas cantoras, assim que se veem prontas para gravar o primeiro CD. Vozes prontas para cantar, e não para dizer algo relevante, poeticamente falando. Isso não significa que Danny deixe de lado a aventura do eu-lírico.

A intérprete assina a letra de "Palavras", emoldurada pela música de Felipe Radicetti. Se a paixão pela música encontra espaço no coração da intérprete, as palavras trazem vida a ela. Segundo Danny, em pequeno depoimento no encarte-poster, sua primeira letra saiu "quase psicografada". Um ótimo começo.

A produção de Tony Pelosi se mostrou acertada, ao deixar que os poucos (e bons) acompanhantes sonoros não competisssem com a titular do CD. As molduras por vezes camerísticas nas faixas mais intimistas não soam monótonas, pelo contrário. "Seda da China", de Adriana Barreiros e Zé Edu Camargo, poderia ser a trilha-tema de um templo budista. "O que eu quero", de Danny, Tony e Léo Nogueira, ilustrariam aquele fim de tarde preguiçoso, espreguiçante, antes do bocejo final para a despedida de um fim de semana calminho.

Os sambas, que aparecem a partir da nona faixa, não destoam da suavidade das faixas anteriores. "Francamente", de Iso Fischer e Etel Frota, tem clima de choro tocado em boteco. Danny dá a dica do clima da canção no encarte: "A gente preferiu chorar de alegria mesmo". A melancolia de "Fim de Carnaval", criada por Sonekka e Gilvandro Filho, é daquelas que teriam lugar nas antologias de grandes momentos da música brasileira, se levadas a um público maior.

"Todo Dia" (faíxa-titulo do disco, parceria de Guilherme Rondon e Alexandre Lemos) fecha o trabalho com uma frase lapidar. Para o feliz ouvinte, é um convite a uma convivência permanente, não mais entre curioso e cantora, mas entre fã e cantora: "Eu e você, todo dia".

Outros trabalhos virão, divas ao velho estilo virão e irão embora. Danny Reis fica.

Um comentário:

Aliz de Castro Lambiazzi **jornALIZta** disse...

Érico, você foi injusto com a Paula Fernandes. Tanto exemplo sobrando aí, de sucessos passageiros, e você pega justo ela, que é talentosíssima? Não acho que ela tem um futuro incerto. Ela já está vivendo o futuro, afinal, não começou ontem, tem estrada já.
Beijo